‘A balança não mede minha luta’: relatos de resistência em corpos em transformação
‘A balança não mede minha luta’: relatos de resistência em corpos em transformação
Por Cláudia Regina dos Santos — Histórias Reais e Reportagens Humanizadas
Quantos gramas pesa a coragem? E a esperança? Qual o valor calórico de um abraço sincero após meses de isolamento tentando “seguir a dieta direitinho”? A resposta, você adivinha: nenhuma balança registra isso. Ainda assim, a cada manhã, milhares de mulheres sobem nos aparelhos digitais – ou analógicos, herança de farmácia – em busca de um número que justifique sua autoestima. Mas hoje, com todo o respeito às metas e aos cardápios, vamos falar de algo maior e mais pesado do que qualquer dígito: a jornada de quem decide emagrecer consciente de que o mais difícil não está na quilometragem, mas na coragem de permanecer.
Mais do que perder peso, é ganhar vida
Quando comecei a entrevistar mulheres para esta reportagem, me preparei para ouvir histórias de dietas milagrosas ou tratamentos estéticos caros. Mas o que encontrei foram relatos de autoacolhimento, de resistência ao julgamento alheio e, principalmente, de reencontro com a própria história. É o caso da Patrícia, 38 anos, pedagoga em Recife, que depois de anos lutando contra a balança descobriu que o verdadeiro peso que carregava era o silêncio.
“Perdi 14 quilos, mas ganhei 10 viagens, 1 curso de dança e o hábito de sorrir de manhã. Eu achava que queria um corpo novo, mas o que eu precisava era de uma vida que me pertencesse”, conta com os olhos marejados.
Patrícia não iniciou nenhuma dieta específica. Começou por caminhar três vezes por semana para lidar com a ansiedade. Encontrou um grupo de apoio virtual, depois experimentou um programa de reeducação alimentar com acompanhamento psicológico gratuito na faculdade da cidade. Em um ano, houve mudança física, sim. Mas o que mudou mesmo foi o jeito como ela olhava para si.
“Não sou o antes e depois”
Quantas de nós já fomos transformadas em “antes” por olhares alheios? A mídia adora o contraste: o corpo gordo triste, apagado, e o corpo magro radiante como prêmio final. Erika, 26 anos, designer gráfica de São Paulo, sabe bem o que é isso:
“Emagreci 19 quilos em nove meses, mas ninguém me parabenizou quando comecei a terapia, quando disse não pra uma relação abusiva ou quando larguei um emprego que me adoecia. Mas bastou eu postar uma foto de short jeans que choveram elogios. A sociedade aplaude o corpo, mas ignora a luta.”
Essa fala dói, porque é verdadeira. Em momentos como esse, Erika brinca usando uma camiseta com os dizeres: “Peso não me define, mas me desafia”. Seu humor ácido é parte da cura.
Transformar sem desaparecer
É preciso cuidado com o imaginário da “superação” associado ao emagrecimento. Muitas mulheres entrevistadas relataram sentir pressão para deixar para trás também sua identidade, seus gostos e até sua maneira de se vestir. O emagrecimento saudável deve contemplar o todo: corpo, mente, história.
Lúcia, 44 anos, bancária, começou sua transformação corporal após o diagnóstico de esteatose hepática. “O médico disse: ‘Você precisa cuidar do seu fígado ou pode ter complicações sérias’. Eu pensei: não quero ficar doente para depois ir viver.” Com acompanhamento nutricional e práticas de autocuidado, ela emagreceu 21 quilos em dois anos. Mas seu maior orgulho está no fato de não ter desaparecido de si mesma.
“Continuei dançando samba, fazendo meus bolos nos domingos (com menos açúcar, confesso) e usando batom vermelho. Não me transformei em uma outra pessoa, só recuperei meu fôlego para ser quem sempre fui.”
Desromantizar a transformação: é difícil, mas possível
Vamos parar um minuto e conversar sinceramente? Nem todo amanhecer é inspirador. Tem dia que o espelho é inimigo. Tem manhã que a caminhada parece longe demais. Nas histórias que ouvi, a constante era uma só: não existe caminho linear ou perfeito quando se fala em cuidar do corpo com propósito.
Por isso, reuni uma lista simbólica, inspirada nos relatos das mulheres que entrevistei:
- Você pode ganhar peso e ainda assim estar se curando.
- É possível não seguir uma dieta à risca e continuar no caminho.
- Você pode odiar academia, mas amar pedalar ao ar livre no fim da tarde.
- E, o mais importante: você pode se amar enquanto se transforma.
O autoconhecimento é o único plano de emagrecimento que serve para todas. Nele não existe índice de gordura corporal, mas intensidade de coragem. Não há número ideal, mas sim um corpo que respira, que dança, que luta, que vive.
Somos mais do que os quilos que perdemos
A ideia de que o valor de uma mulher precisa ser comprovado em números é tão antiga quanto injusta. Em cada história compartilhada, percebi o quanto nosso corpo carrega bandeiras: de resistência, de amor-próprio, de justiça consigo mesma.
Chega um momento em que é preciso descer da balança e escutar aquilo que nenhuma máquina capta: o som do coração batendo firme após uma caminhada difícil, o riso solto depois da aula de dança, o choro de alívio ao tentar novamente e não desistir.
Essas são as vitórias que não aparecem nos antes e depois. Mas são elas que sustentam cada passo do agora.
Por fim, um convite
Se você está lendo esse texto e carrega no corpo ou na alma qualquer peso que te disseram ser inadequado, eu te convido a fazer um pequeno exercício: em vez de se pesar hoje, escreva tudo o que você venceu até aqui. Pode colocar na porta da geladeira, no espelho do banheiro ou numa folha dobrada na carteira. Mas escreva, com sua letra, porque talvez essa seja sua medida mais justa.
A balança não mede sua luta. Mas você pode celebrá-la — em voz alta, com orgulho e do seu jeito. Sempre.
Com afeto e verdade,
Cláudia Regina dos Santos
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