A cozinheira e o jejum: como Ana perdeu peso sem abrir mão do afeto na panela

A cozinheira e o jejum: como Ana perdeu peso sem abrir mão do afeto na panela

Quando Ana me contou que estava fazendo jejum intermitente, confesso que franzi a testa. “Mas você é cozinheira!”, quase gritei, imaginando uma cozinha cheia de aromas, panelas borbulhantes e forminhas untadas, tudo esperando para ser provado. Ela, com aquele jeito sereno de quem tempera com ervas e amor, riu e respondeu: “Justamente por isso, Cláudia. Foi cozinhando com mais consciência que eu emagreci.”

Nessa reportagem, convido você a conhecer a jornada de Ana Oliveira, 44 anos, chef caseira e mãe de dois filhos. Em meio a panelas, receitas da avó e uma nova relação com o tempo (e com o prato), essa mulher venceu a balança sem abrir mão do sabor – e muito menos do afeto que sempre colocou em cada refeição.

Entre o açucareiro e a balança: o ponto de partida

Ana sempre amou cozinhar. Cresceu em Minas Gerais, cercada pelo cheiro de pão de queijo no forno e doce de leite feito no tacho. Com o tempo, transformou a paixão em profissão: montou uma pequena cozinha delivery em São Paulo, especializada em comfort food com ingredientes naturais.

“Mas conforto demais engorda”, ela me disse rindo, ao lembrar dos anos em que saboreava cada colherada das suas criações. E o ponteiro da balança subia junto com os elogios dos clientes.

Até que um dia, numa consulta de rotina, lhe jogaram a verdade no colo: 94 quilos, colesterol alto, gordura no fígado e uma pressão arterial disfarçada de panela de pressão prestes a explodir.

Um plano com alma e método

Ao invés de dietas radicais ou shakes enlatados, Ana escolheu respeito. Por ela mesma, pela tradição da comida que carrega histórias e pela saúde. Conheceu o jejum intermitente por indicação de uma amiga nutricionista e se encantou com a proposta.

“Não era sobre deixar de comer, era sobre comer na hora certa e com presença”, diz ela. Começou com jejum de 12 horas, avançando lentamente para 14 e depois 16. “Eu acordava, tomava água com limão, organizava a cozinha e só comia às 10h. Era estranho, porque cozinhar sem experimentar parecia pecado. Mas aprendi a ouvir o corpo.”

Cozinhando sem provar? É possível sim, senhora!

Essa foi a parte mais desafiadora: seguir com as receitas e não beliscar. Porque cozinheiro que é cozinheiro vai com a colher direto na panela, só para “ver se está bom”.

A solução? Ana passou a usar referências visuais e aromáticas. Sabia que determinado ponto da cebola era quando ela ficava translúcida e começava a soltar o aroma doce. Usava pitadas medidas, tempos controlados e pequenas provadas fora do jejum para ajustar receitas. “Com o tempo, a gente aprende a confiar no próprio taco – ou colher de pau.”

Preparar a comida dos outros enquanto jejua: uma meditação

Durante o jejum, Ana passou a ver o ato de cozinhar com outros olhos. “Era quase uma meditação. Mexer um risoto, cortar legumes, sentir o cheiro do alho dourando… tudo isso sem comer, mas com entrega. Eu estava mais presente, e a comida saía ainda mais gostosa, acredita?”

Ela manteve intacto o ritual de preparar a mesa dos filhos – e mesmo sem comer, sentava com eles para conversar. “A comida une, mesmo quando a gente não põe no prato.”

O que mudou na prática?

Ao longo de 10 meses, Ana perdeu 23 quilos. Mas ela insiste: esse número é só parte da história. O mais valioso não foi o manequim novo, mas as pequenas-grandes vitórias do dia a dia:

  • Acordar sem dor nas articulações
  • Voltar a caminhar no parque com os filhos
  • Ter energia para encarar um dia inteiro na cozinha
  • Descobrir o prazer de comer com calma e intenção

Ela refez suas receitas favoritas em versões mais leves: o feijão continua grosso, mas agora entra menos óleo e mais ervas; o bolo de fubá ganhou aveia e menos açúcar. “A memória afetiva ficou, com menos culpa. Cozinhar é cuidar, e agora cuido de mim também.”

Jejum intermitente: o que você precisa saber

O jejum intermitente consiste em alternar períodos de alimentação com períodos sem ingestão de alimentos. Ele pode ter vários formatos:

  1. 12×12: jejum de 12 horas, alimentação nas 12 seguintes
  2. 16×8: jejum de 16 horas, alimentação em 8
  3. 5:2: cinco dias de alimentação normal, dois com restrição calórica

A prática deve sempre ser feita com acompanhamento profissional – principalmente para quem tem alguma condição de saúde, como diabetes ou distúrbios alimentares.

Bebidas permitidas durante o jejum

  • Água com ou sem gás
  • Chás sem açúcar
  • Café preto puro

Importante: cada organismo reage de um jeito. Ana encontrou um modelo que funcionou para ela, mas isso não significa que sirva para todos. O essencial é o autoconhecimento e o acompanhamento com nutricionista.

A comida como elo, não como fardo

A história de Ana mostra que é possível sim perder peso sem exorcizar o prazer de comer. Ela não cortou o pão de queijo da vida – mas aprendeu a valorizá-lo como merece: aos domingos, com café coado e conversa em volta da mesa.

“O problema nunca foi o pão de queijo. Era o exagero, a falta de escuta ao corpo e a pressa. Hoje, cada mordida tem presença”, ela me diz, com orgulho nos olhos e brilho no avental.

Essa história é sobre equilíbrio. Sobre celebrar o amor pelas panelas sem deixar que isso pese – nem na alma, nem no corpo.

Na sua cozinha, quem manda é você

Se você também é do time que ama cozinhar, mas sente que perdeu o controle do apetite, inspire-se em Ana. O jejum intermitente pode ser uma ferramenta de reconexão, mas mais importante do que isso é cuidar de si com o mesmo carinho com que se prepara um prato para quem se ama.

Porque no final das contas, como Ana bem diz, “jejum não é sobre passar fome, é sobre escolher a hora certa de nutrir o corpo – e a alma.”

E pode anotar aí a receita principal: afeto continua sendo o ingrediente mais importante.

— Por Cláudia Regina dos Santos

Publication date:
Author: Cláudia Regina dos Santos
Jornalista investigativa com mais de 20 anos de atuação, especializada em saúde e alimentação. Com estilo empático e engajado, destaca questões sociais e estruturais, especialmente ligadas à população negra e periférica. Usa linguagem próxima e acessível para humanizar dados e estatísticas.

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