Da feira à academia: a jornada de Dona Zuleide, que perdeu 18 kg sem deixar de comer mungunzá

Da feira à academia: a jornada de Dona Zuleide, que perdeu 18 kg sem deixar de comer mungunzá

Imagine uma mulher nordestina arretada, de olhos vivos e passos determinados, mesmo que às vezes mais lentinhos por conta dos joelhos. Essa é Dona Zuleide, 61 anos, moradora do bairro do Curió, em Fortaleza, e protagonista de uma daquelas histórias que fazem a gente rir, chorar e, no fim, querer levantar do sofá e mudar de vida.

Ela não é influencer, não anda de legging colorida o dia todo e jamais diria “zero glúten, zero açúcar” — pelo contrário! Se tem uma coisa que Dona Zuleide ama é o bom e velho mungunzá, feito com milho branco, leite de coco e um toque de carinho, daquele que só vó sabe colocar.

Mas a verdade é que, entre um prato cheio de tradição e cobranças do próprio corpo, ela decidiu transformar sua vida. E transformou, viu? Perdeu 18 kg em um ano, ganhou fôlego, autoestima e uma comunidade inteira de admiradores lá no grupo de zumba da praça da igreja. Agora, senta que lá vem história boa e cheia de inspiração — daquele jeito que só eu, Cláudia Regina dos Santos, conto: com afeto, risada e muito respeito.

Um ponto de partida: o susto e a decisão

Aos 61 anos, com pressão oscilando, cansaço para subir escada e exame de sangue gritando: chegou a hora. “Minha filha, o médico olhou pra mim e disse: ‘Se continuar assim, o destino é o hospital’. Aí na hora passou um filme na minha cabeça. Pensei nos meus três netos, nas minhas plantações de coentro da feira, e minha vontade foi: eu não quero ir pro hospital, quero dançar com minhas netas no aniversário delas!”, conta ela, com a voz engasgada.

Foi então que Dona Zuleide, vendedora de temperos e raízes medicinais na feira do Jangurussu, traçou seu plano. Não seria desses de passar fome ou cortar tudo o que ama. O plano era dela, com metas afetivas, comidinhas adaptadas, apoio da amiga Terezinha (a parceira de caminhada) e, claro, com direito a mungunzá no domingo.

A reeducação de quem sempre cozinhou com o coração

Vamos combinar: mudar a alimentação não é lá novidade. O segredo está no como e no por quê. O que Dona Zuleide fez foi uma reeducação alimentar baseada no afeto. Ela aprendeu com uma nutricionista do posto de saúde que dá sim pra comer o que ama com alguns ajustes.

  • O mungunzá, antes carregado no açúcar, passou a ser adoçado com um pouco de stevia e menos leite condensado.
  • O prato do almoço, que antes transbordava arroz e carne, ganhou salada colorida em metade do prato, arroz integral e frango cozido temperado na folha de louro.
  • Os bolinhos fritos da tarde deram vez à batida de banana com aveia e canela. “A vontade de mastigar passa, meu bem, quando o coração entende o propósito”, ela brinca.

Nada de radicalismo. Dona Zuleide come de tudo: teve tapioca com queijo coalho, teve pamonha de milho novo, teve cuscuz com ovo mexido. Mas tudo em porções menores, com água de gengibre do lado e muita consciência.

Da feira à praça: a descoberta da dança

Quando o corpo começou a ficar mais leve, a alma pediu movimento. E foi assim que, numa tarde de terça-feira, ao entregar um maço de hortelã na feira, ela ouviu o barulho vindo da praça: uma aula de zumba comunitária. Curiosa, se aproximou, observou, sorriu e foi ficando no cantinho.

No segundo dia, mexeu os ombros. No terceiro, os pés. Na segunda semana, já tava lá na frente, errando os passos mas com uma alegria nos olhos de emocionar. Hoje, ela é conhecida como “Furacão da Praça da Paz”.

“Eu danço com alma. Meu joelho reclama, mas eu mentalizo que ele vai aguentar só mais uma música. Dançando, eu esqueço qualquer tristeza”, declara, com a típica gargalhada que ecoa pelos bancos da praça.

Resultado: corpo leve, vida cheia

Em um ano, Dona Zuleide reduziu 18 kg. A pressão estabilizou, o sono melhorou, as dores nas costas diminuíram. Mas mais do que isso, ela reencontrou uma versão dela mesma que tinha ficado escondida atrás de boletos, panela no fogão e rotina difícil.

Ela passou a ser inspiração: na feira, virou a “guru do chá-emagrecedor-bom-mesmo-é-o-da-Zuleide”, e na praça, já lidera o alongamento pré-aula. Conseguiu também orientar outras feirantes a substituírem o refrigerante pela água com hortelã, e ajudou o neto a emagrecer 5 kg só com receitas da vovó reformuladas.

O papel do afeto no emagrecimento

Conversando com Dona Zuleide, percebo o que os estudos científicos já apontam: ninguém emagrece com raiva do próprio corpo. Ela deu um passo adiante porque se amou o suficiente para querer continuar vivendo bem. O corpo dela mudou porque a cabeça e o coração mudaram antes.

“As pessoas pensam que gente velha não muda. Mas mudar é viver, minha filha. Eu não deixei de ser eu, só aprendi que a Zuleide saudável também é a Zuleide que ama mungunzá”, diz sorrindo, me oferecendo uma colheradinha do dito cujo.

Conclusão: histórias que pesam na alma, não na balança

A trajetória de Dona Zuleide é uma verdadeira aula de amor-próprio, simplicidade e sabedoria popular. Ela mostra que emagrecer não é sobre se frustrar ou se privar, mas sim sobre se reinventar com alegria, acolhimento e respeito às próprias raízes.

Que essa história toque teu coração como tocou o meu — e que você também possa encontrar seu próprio ritmo, sua dança, seu prato predileto em versão leve e sua caminhada possível.

Como diria Dona Zuleide: “Não precisa deixar de ser quem você é. Só precisa lembrar de cuidar de quem você ainda quer ser.”

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Author: Cláudia Regina dos Santos
Jornalista investigativa com mais de 20 anos de atuação, especializada em saúde e alimentação. Com estilo empático e engajado, destaca questões sociais e estruturais, especialmente ligadas à população negra e periférica. Usa linguagem próxima e acessível para humanizar dados e estatísticas.

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