‘Eu só queria correr com meu filho no parque’: o que moveu Renato a vencer a obesidade severa

“Eu só queria correr com meu filho no parque”: o que moveu Renato a vencer a obesidade severa

Renato Silva, 41 anos, gerente de logística em uma transportadora no interior de São Paulo, nunca sonhou com maratona. Nem dieta low carb, nem suplemento, nem academia de cinco horas por dia. O sonho dele era muito mais simples — e, ao mesmo tempo, algo que para muitos passa batido no dia a dia: correr com o filho no parque.

Mas quando Renato tentou correr com o filho de 7 anos numa tarde ensolarada de sábado, após menos de dois minutos ele já sentia o coração disparar, a respiração falhar e uma vergonha que parecia pesar mais que seu próprio corpo. Na época, Renato pesava 148 kg, classificando-se com obesidade grau III — também conhecida como obesidade mórbida.

“Eu voltei pra casa destruído. Meu filho estava super empolgado, queria brincar, correr, jogar bola. E eu… não consegui acompanhar. Aquilo me quebrou por dentro. Não era só o peso físico. Era o peso de perceber que eu estava perdendo a infância dele.”

O primeiro passo: reconhecer que havia um problema

A história de Renato é o retrato de milhões de brasileiros que vivem com obesidade severa. Durante anos, ele conviveu com o peso oscilando, dietas que não duravam mais do que duas semanas e um estilo de vida cada vez mais sedentário. “Eu achava que eu era preguiçoso, sem vergonha. Escutava isso da escola até a vida adulta. Mas a verdade é que eu estava muito perdido e desinformado.”

O ponto de virada veio com o próprio filho, Lucas, de forma completamente inusitada — com um desenho animado. “Estávamos assistindo um episódio do ‘Daniel Tigre’, e o personagem falava sobre fazer escolhas saudáveis. O Lucas virou pra mim e disse: ‘Papai, você não escolhe as coisas saudáveis. Por isso você fica cansado pra brincar comigo?’ Eu sorri na hora, mas aquela pergunta me atravessou como um raio.”

Da dor à ação: buscar ajuda especializada

Após esse episódio, Renato decidiu que não podia mais adiar. Marcou uma consulta com uma endocrinologista, que o encaminhou para um programa multidisciplinar de reeducação alimentar e acompanhamento psicológico. Foi o começo da mudança, mas não foi fácil.

“No começo, eu me sentia invadido. Era como se tivessem aberto minha vida toda, hábitos, vícios, crenças. Mas, com o tempo, fui entendendo que sem esse olhar completo, seria impossível sair do lugar.”

O processo de emagrecimento dele envolveu:

  • Consulta regular com endocrinologista e nutricionista
  • Psicoterapia semanal para lidar com a compulsão alimentar
  • Atividades físicas leves e progressivas (iniciadas com caminhadas de 10 minutos)
  • Participação em grupo de apoio para pessoas com obesidade

Renato frisa: “Perder peso não foi o centro do tratamento — ganhar saúde foi. O emagrecimento veio como consequência.”

As pequenas vitórias que ninguém vê

Quando falamos de transformação corporal, o antes e depois costuma chamar atenção. Mas Cláudia Regina — que vos escreve — sabe bem: as pequenas vitórias silenciosas são as que sustentam a jornada toda. Renato também aprendeu isso na prática.

“Teve um dia que consegui amarrar o tênis sem precisar sentar. Parece pouco, mas eu não fazia isso há anos. Outro dia, consegui entrar no banco do carona do carro da minha esposa sem empurrar o banco pra trás. São coisas que mostram que você está reconquistando sua autonomia.”

Com o tempo, a balança começou a mostrar resultados. Em 14 meses, com acompanhamento médico contínuo, Renato eliminou 46 kg. Mas mais do que os números, ele celebrou outra conquista: a primeira corrida com o filho.

O reencontro com o parque

Com o peso mais controlado, exames laboratoriais estáveis e muito mais disposição, finalmente chegou o dia. Um sábado de manhã, céu azul e o parque vazio. “Dessa vez, eu corri, e a gente correu junto. Ele ria, me puxava pela mão, olhava pra mim e gritava: ‘Corre, pai!’”.

Renato se emociona ao contar. “Não foi uma maratona. Foram três voltas curtas. Mas para mim, foi o maior prêmio da vida.”

Mais do que perder peso: ganhar vida

Hoje Renato mantém uma rotina equilibrada. A alimentação inclui alimentos naturais, menos ultraprocessados, mais frutas e legumes. Caminha e faz treinos com peso duas vezes por semana. Dorme melhor. E trabalha menos horas extras para ter mais tempo com o filho e a esposa.

Segundo ele, os principais aprendizados da sua jornada foram:

  1. Buscar ajuda profissional: ninguém supera uma condição grave como a obesidade sozinho.
  2. Parar de buscar atalhos: dietas da moda e pílulas milagrosas nunca funcionaram com ele.
  3. Ter um propósito real: não era sobre estética, era sobre brincar com o filho e estar presente.
  4. Celebrar as pequenas conquistas: cada degrau, cada superação merece ser reconhecida.
  5. Largar a culpa: entender que obesidade não é fracasso moral, mas uma questão de saúde complexa.

Uma transformação que vai além do corpo

A jornada de Renato, como muitas que passaram e ainda passarão por aqui na editoria Histórias Reais e Reportagens Humanizadas, mostra aquilo que eu — Cláudia Regina dos Santos — acredito do fundo do meu coração: não existe peso ideal que valha mais do que a dignidade, a saúde mental e os afetos que fazem a vida valer a pena.

Renato é daqueles homens discretos, que não buscam holofote. Mas aceitar compartilhar sua história aqui foi uma forma de, segundo ele, “inspirar alguém que esteja, agora mesmo, tentando amarrar o tênis e sentindo que não consegue”.

Se essa história te tocou — respire fundo. Talvez hoje você não consiga a corrida, mas quem sabe uma caminhada, um passo. O movimento começa assim. E, como o próprio Renato aprendeu, ninguém precisa fazer esse caminho sozinho.

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Author: Cláudia Regina dos Santos
Jornalista investigativa com mais de 20 anos de atuação, especializada em saúde e alimentação. Com estilo empático e engajado, destaca questões sociais e estruturais, especialmente ligadas à população negra e periférica. Usa linguagem próxima e acessível para humanizar dados e estatísticas.

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